Monday, June 14, 2010

Num mundo à parte - Parte 1


Marília chegou a casa furiosa e triste ao mesmo tempo. Passou pela cozinha a correr e fingiu não ouvir quando o pai lhe perguntou se já sabia das notas. Pura e simplesmente correu para o andar de cima. “Não, hoje não”, e empurrou a porta do quarto arremessando a mochila para o chão. Ligou o leitor de CDs e atirou-se para cima da cama a ouvir Pink Floyd. Agora não queria falar das notas, nem do facto de estar reprovada a matemática. Não ia de certeza realizar os sonhos dos outros e ir para medicina. Isso não constava na sua própria lista de sonhos, aliás a sua lista era bem reduzida, só continha três itens e os três pareciam cada vez mais inalcançáveis. Detestava a escola onde andava, a turma em que estava inserida, as disciplinas que tinha, especialmente a puta da matemática à qual acabara de tirar 1. Não, nada estava certo na sua vida, queria coisas diferentes, um estilo de vida diferente, uma cidade diferente, amigos com quem pudesse falar de tudo e não só das novas colecções de “roupas giríssimas” que tinham acabado de sair e do quanto é altamente aquele filme fútil que toda a gente viu. Não, ela queria algo diferente, tudo à sua volta estava errado e distorcido. Esticou-se na cama e tentou mentalizar-se de que tinha, pura e simplesmente, acabado de reprovar, a sua primeira reprovação durante toda a sua vida escolar… Isso não lhe podia estar a acontecer, parecia um pesadelo, os pais iam ficar furiosos por causa daquilo e a irmã ia fingir que a defendia mas só ia acabar por piorar tudo.
Era, sem duvida, o pior primeiro dia de férias de sempre, só lhe apetecia refugiar-se naquele canto da mente cheio de fantasia e contos de fadas em que ela se habituara a refugiar quando era criança. Lá é que se estava bem, tinha amigos e era uma guerreira japonesa, influencia de ler tanta mangá diariamente, e protegia um príncipe atraente e interessante chamado Maurício, nome que Marília adorava. E depois passava horas e horas a inventar cenários onde toda a gente a admirava e achava bonita. Um mundo imaginário onde ela não tinha os dentes tortos, e onde era aceite e ninguém a achava esquisita. Inventava um grupo de amigos que a acompanhavam em aventuras e onde eram todos os heróis do seu mundo imaginário.
Mas, com o passar dos anos, o seu mundo imaginário foi ficando mais fraco e foi relutantemente trocado pelo mundo real, onde as pessoas eram frias e cinzentas, onde não existiam grandes planícies para andar a cavalo e onde nenhum rapaz demonstrava qualquer interesse por ela. Não que isso a incomodasse muito, na realidade sim, incomodava, mas Marília fazia de conta que não. É mais uma daqueles pessoas que encontra refúgio em mentir a si própria. Vivia a sua vida, escrevia os seus poemas e ia deixando o mundo da fantasia cada vez mais para trás. No entanto, em momentos de tristeza, tentava sempre refugiar-se nesse cantinho especial da sua mente e já quase esquecido. Mas, a inegável verdade, é que ela sempre achara os cenários construídos pela sua imaginação mais sua casa do que o próprio cenário real que a rodeava naquele mesmo quarto.
Voltou-se na cama e olhou para o tecto coberto de posters e desenhos. Tentara ao máximo tornar aquele espaço num reflexo da sua personalidade mas não havia meio de o conseguir, faltava sempre qualquer coisa, um grande pedaço aliás. Mas o quê? Que raios lhe faltava para chegar a casa e se sentir em casa?


Texto por: Snow White
Imagem por: James Jean

(Nota: Vá lá, vão "easy on me", eu adoro fantasia, leio livros de fantasia todos os dias e, lá no fundo, ainda sou excessivamente teen, por isso perdoem-me esta historinha de fazer arroz, que vair continuar, repito, VAI CONTINUAR).

3 comments:

Anonymous said...

Muitas vezes o melhor arroz, é o branco, simples e sem grandes têmperos. Nem só de caldeiradas ou feijoadas condimentadas, vive o homem. E há alturas, em que arrozinho com apenas umas pitadas de sal, me enche plenamente a barriga =)
Uma coisa é certa, já me abriste o apetite e fico ansiosamente à espera para uma segunda dose ^__^
CatPrince *

Snow said...

Espero que o apetite se mantenha porque eu acho que vou retroceder muito no meu estilinho de escrita nesta história. Eu culpo o George R.R. Martin e a MZB, por me fazerem andar sempre com a cabeça nas nuvens.

Drake said...

Começo a ficar habituado a que tu me deixes curioso, e isso nao é bom -.- mas va Keep it coming..pleasee

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