As noites quentes de Outono,
tão raras nos dias que correm, acolhem os tolos que sagazmente as percorrem.
Dentro dos corpos, o sangue vai esfriando pois não há noite que o aqueça. Dois
vultos caminham próximos um do outro de modo a que estranhos saibam que estes
caminham juntos na mesma direcção, mas não próximos o suficiente para que se
lhe adivinhe a proximidade amorosa. É a inconsequente natureza que revela
desrespeitosamente vestígios humanos de amor. Amor esse que varia de gato para
cão.
O homem, avermelhado,
adoentado, ciente do seu poder, deixa-se cair em amena indiferença enquanto a
mulher que o acompanha teima em esbracejar e vociferar, aparentemente
incansável. Falta de tacto. Cada um, a seu jeito, defende teimosamente a
veracidade do sentimento alheio. Neste pacto evidentemente destrutivo, o homem,
à vista armada e desarmada está claramente a ganhar.
Um gato, interesseira
criatura, salta do terreiro dos vizinhos e cruza-se no caminho do reticente
casal. Roça-se nas pernas da mulher que, incomodada, o enxota. O gato, teimosa
criatura, não se deixa desencorajar e roça-se agora nas pernas do homem que,
facilmente rendido, se propõe de imediato a fazer-lhe festas no cachaço.
Animado e bonacheirão, o gato, reconhecido especialista nas artes do lazer, de
imediato começa a miar e a ronronar, encorajando o homem a agachar-se no meio
da rua de forma a que todas as suas fugazes necessidades afectivas sejam de
imediato satisfeitas. Consolado, este estende-se no chão alheio a quem pertencem
as mãos que o afagam.
A estas mãos está ligado um
braço, que termina triunfalmente num ombro jovem e bem delineado. Um pescoço
segura de forma invulgarmente delicada um perfil de homem, de olhos postos na
pequena criatura parda que se roça com o seu pelo macio debaixo dos seus dedos
e mãos fortes. As pestanas longas suavizam qualquer possível maldade que o
rosto possa ocultar e os lábios grossos e sensuais estão cerrados num
permanente sorriso ausente.
E depois aborreci-me.
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