Tuesday, September 24, 2013
Lucia Luz
Lúcia acordou antes de a manhã nascer,
beijou as costas do homem que dormia a seu lado e pôs uma t-shirt antes de sair
do quarto e acender um cigarro enquanto entreabria a janela da sala. Mais um
dia sem escrever, sem trabalho, sem sol. Mais um mês assim e nem dinheiro tinha
para cigarros. Coçou a cabeça, a eczema tinha-se alastrado até ao pescoço e ela
começou a espetar-lhe as unhas enquanto observava com atenção o nascer do sol.
Bem, não o nascer do sol porque os prédios tapavam essa bendita visão. Apenas
testemunhava o fraco desvendar luminoso de um típico dia de inverno. Sem meias
medidas atira a beata para o terraço do vizinho de baixo, passa os dedos pelo
cabelo e veste uns jeans já demasiado gastos que estavam caídos no chão calçando
por fim umas botas quentes e ligeiramente mal cheirosas. E como acredita
genuinamente que o pequeno-almoço é a refeição mais importante (e por vezes
única) do dia prepara uma taça de cereais com leite frio. Come de pé e
apressadamente e, depois de arrumar a tigela, passa novamente as mãos pelo
cabelo curto e oleoso. Liga a TV num canal que passa programas de
animais, descobre que na Índia se bebe mijo de vaca para curar o cancro e a
sida e ri-se desdenhosamente da esperança dos outros. Terminado o ritual
matinal vai ao quarto buscar as moedas esquecidas em cima da secretária e guarda-as
no bolso.
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Personagens,
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